A cada dez executivos gays de grandes empresas, apenas três falam abertamente de sua orientação sexual. Os dados foram levantados pela consultoria holandesa Out Now, especializada no público LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) e mostram que a sexualidade ainda é um tabu dentro das corporações. Para Ricardo Sales, pesquisador em diversidade e sexualidade e professor da Universidade de São Paulo, as companhias precisam criar uma cultura de inclusão. No entanto, de acordo com Sales, o Brasil está longe de apresentar o cenário ideal nesse caso. “Poucas empresas brasileiras estão oficialmente engajadas na questão”, destaca.
Para ele, revelações recentes, como a de Tim Cook, CEO da Apple que revelou a sua homossexualidade, contribuem para fomentar a diversidade nas organizações. Em outras multinacionais, como o HSBC, o CEO Antonio Simões também veio a público assumir sua sexualidade, em 2015. Em entrevista ao blog da Appus, Ricardo Sales falou um pouco mais sobre o assunto.
É mais fácil se assumir como LGBT sendo um grande executivo?
Para que o funcionário LGBT possa falar abertamente de sua sexualidade, é preciso criar um ambiente inclusivo. No caso do Tim Cook, foi fundamental. Quando o presidente da empresa se posiciona sobre isso, há um uma influência positiva, porque diversas regras e políticas passam por ele. No entanto, ainda é complexo: muitos executivos não saem do armário porque estão presos a uma cultura empresarial conservadora. No Brasil, não temos nenhum executivo que fale abertamente sobre o tema. É preciso mudar e expandir o diálogo em prol da causa. As organizações têm uma voz poderosa e um papel fundamental nesse debate.
Por que as empresas brasileiras não fomentam o debate?
A conversa sobre diversidade tem um contexto histórico. Nos Estados Unidos dos anos 1960 houve um grande movimento da população negra, das mulheres e dos LGBT. Assim, com o passar dos anos, o governo norte-americano passou a adotar políticas de cotas para estimular a diversidade. Não foi o que aconteceu por aqui. A repressão promovida pela ditadura afetou as minorias e só começamos a falar de diversidade nas organizações no final dos anos 1990, com a chegada de multinacionais dos Estados Unidos. Conseguimos avançar um pouco, mas ainda estamos muito abaixo do ideal. Poucas empresas brasileiras estão oficialmente engajadas na questão. Apenas quatro companhias nacionais participam do Fórum de Empresas e Direitos LGBT. O Brasil é um país que gosta de se posicionar como uma nação aberta às diferenças, que estimula a diversidade. Na prática, não é o que acontece e ainda vivemos um paradoxo: temos a maior Parada LGBT do mundo e o maior número de LGBTs assassinados por ano, com 340 pessoas mortas em crimes de ódio.
Empresas como o Google contam com os Gayglers, a McKinsey tem a Glam. Como essas divisões auxiliam as empresas na criação de um ambiente mais inclusivo?
Esses movimentos geram inspiração e fazem um trabalho mais proativo. Eles debatem o tema e, com isso, trazem cadeias de valor para dentro da companhia. Portanto, a companhia cria compromissos muito claros com seus colaboradores. E, ao deixar o debate público, elas estimulam que seus parceiros, fornecedores e clientes façam o mesmo. É uma transformação da cultura organizacional.
Há muitos casos de pessoas que não conseguem evoluir na carreira depois que se assumem?
Recebo muitas mensagens de pessoas amedrontadas, que não sabem que posição tomar quando o assunto é sexualidade no ambiente de trabalho. Elas ficam com a autoestima baixa e sentem medo de falar abertamente sobre o assunto. Pensam que isso pode gerar restrições, punições e outras sanções dentro do escritório. Segundo dados da Out Now, 35% dos funcionários costumam sair do armário. Ou seja, pelo menos dois terços dos colaboradores ainda tem medo e escondem parte das suas vidas. Muitos precisam mentir e trocar nomes e pronomes para se referir a companheiros. Isso reflete, inclusive, na produtividade. Um colaborador infeliz consequentemente vai produzir menos.
O que as empresas podem fazer para estimular a diversidade?
O primeiro passo é o engajamento da alta liderança com relação a pauta da diversidade. São questões que afetam a produtividade dos funcionários e, consequentemente, impactam nos negócios. Também é necessário investir em processos de comunicação interna, interpessoal e até publicitária, para mostrar que a organização se importa com o tema. É uma forma de espalhar mensagens positivas e de cunho educativo. Mas não são apenas as empresas que precisam se mexer: temos que debater diversidades nas escolas, por exemplo. São elas que vão dar a base para os futuros colaboradores dessas companhias.
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